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Um breve ensaio sobre a verdade

A verdade pode ser considerada um ponto de vista. De fato, a verdade sempre apresentará três versões distintas, a de quem fala, a de quem ouve e a real, sendo que esta última, talvez nunca seja conhecida.

Olá!

Faz alguns meses que penso em escrever sobre este tema, todavia, a cada novo artigo algum outro tema mais urgente e, nem por isso mais importante, acaba tomando o espaço e este pequeno ensaio volta para a gaveta mental das ideias que não afloram. Hoje a história mudou e o texto com sua vida própria acaba de aflorar e se apresentar a você, meu querido leitor.

Pare por um momento e olhe atentamente o mundo ao seu redor. Observe as pessoas, as coisas, sinta os cheiros e sons. Existem coisas que lhe agradam e certamente outras tantas que não, separando o seu mundo entre coisas boas, ruins e indiferentes. Este sentido inconsciente de valorização está associado diretamente ao seu conceito de certo e errado, ou como dizem os especialistas, o seu sistema interno de crenças. Um conjunto próprio e único e valores que separa o bom do ruim, o certo do errado, o prazer do sacrifício.

Em outras palavras, este sistema define seu conjunto e verdades.

Interessante pensarmos na verdade como um conceito plural. Lembro de quando era criança e recebia frases prontas como:

  • A verdade é uma só;
  • Quem fala a verdade não merece castigo;
  • Uma hora a verdade aparece;
  • A mentira tem pernas curtas.

Naquela época me parecia que a verdade era absoluta, como algo mágico conhecido somente pelos adultos e que deveríamos buscar sempre e à toda hora. Hoje, passados quase cinquenta anos, posso dizer com toda a certeza que a verdade é um ponto de vista. Cada um de nós percebe a verdade de acordo com nosso sistema mental e obviamente nosso sistema de crenças interno.

No excelente filme “O contato dirigido por Robert Zemeckis”, estrelado por Jodie Foster, pai e filha discutem sobre a crença no divino e a existência de Deus. Em dado momento a menina pergunta sobre como o pai pode ter tanta certeza de algo e ele responde simplesmente: “Eu escolhi acreditar nisso”.

Esta singela passagem demonstra, de forma exemplar, como a verdade pode ser considerada um ponto de vista e obviamente, carece de permissão do crente para se tornar realidade. De fato, a verdade sempre apresentará três versões distintas, a de quem fala, a de quem ouve e a real, sendo que esta última, talvez nunca seja conhecida.

A verdade ocupa o espaço da dúvida, dando fim a discussões, pensamentos, filosofias e até mesmo a essência de nossa existência. Acredito que por isso, muitas pessoas temem ficar cara a cara com a verdade, ainda que fiquem de frente com uma de suas versões.

A esposa que desconfia que o marido não lhe é fiel, entretanto, este mesmo marido é bondoso, carinhoso, provedor e responsável. A névoa da dúvida, por vezes é muito mais confortante que a certeza absoluta do fato, que pela simples existência aniquilará a relação demandando que ações drásticas sejam tomadas. Os folhetins literários estão repletos de situações como estas.

No momento que escrevo estas linhas, o Brasil está prestes e afastar pela segunda vez um presidente da república eleito democraticamente e vemos forças opostas discutindo a verdade dos fatos. Hora um lado com provas, hora o outro lado com contraprovas, mas de fato, nem mesmo a decisão democrática colocará fim a este estado de dúvidas. Houve crime ou não?

Acredito que voltaremos à obra de Zemeckis e a verdade será algo que escolhemos acreditar.

Mas, como fazemos esta escolha?

O que nos faz querer acreditar em algo?

O fator mais importante é a credibilidade do interlocutor. Quando uma pessoa em quem confiamos nos passa sua visão de mundo, tendemos a acreditar sem questionamento, criando uma verdade absoluta ou um dogma. Pense nas coisas que você acredita por acreditar e ponto. Muito provavelmente, estas coisas lhe foram contadas na primeira infância por alguém de sua confiança como seus pais ou seus professores.

Em seguida, tendemos a acreditar em nossas experiências pessoais. Coisas que vivemos e sentimos nos fazem acreditar que podem se repetir. Como por exemplo, a certeza de que o fogo pode queimar, que determinado grupo de pessoas não é confiável, que determinado alimento faz bem ou mal e assim por diante. Este é o nosso senso comum falando e nos fazendo acreditar que o passado determina o futuro. Esta versão da verdade é elástica o suficiente para receber a experiência de terceiros e acreditamos que se algo aconteceu com outra pessoa, também pode acontecer conosco. Assim, acreditamos em livros de autoajuda com fórmulas milagrosas, dietas absurdas e até mesmo, nos testemunhos largamente utilizados por vertentes religiosas.

Finalmente, acreditamos em fatos e dados. Provas materiais, números e evidências. Estes são os únicos elementos que podem se sobrepor aos dois anteriores, contudo, sempre haverá um espaço para a discussão pois eles se estabelecem como fatos que são, não criando em quem ouve a permissão para acreditar.

Assim, meu querido leitor, não espero que você acredite em tudo que leu aqui. A verdade é sem sombra de dúvida uma permissão que concedemos aos fatos para que possam integrar a nossa forma de pensar. Verdades podem ser construídas, empacotadas e vendidas de acordo com o interesse de seu criador. Quanto mais formos capazes de criar verdades e repassá-las adiante, mais aceitos, acolhidos, bem-sucedidos e influenciadores seremos.

Requer prática e muita habilidade. Mas no final tudo recompensa.

Não é verdade?

Edson Carli Author
Edson Carli é especialista em comportamento humano, com extensa formação em diferentes áreas que abrangem ciências econômicas, marketing, finanças internacionais, antropologia e teologia. Com mais de quarenta anos de vida profissional, atuou como diretor executivo em grandes empresas do Brasil e do mundo, como IBM, KPMG e Grupo Cemex. Desde 2003 está à frente do Grupo Domo Participações onde comanda diferentes negócios nas áreas de consultoria, mídia e educação. Edson ainda atua como conselheiro na gestão de capital humano para diferentes fundos de investimentos em suas investidas. Autor de sete livros, sendo dois deles best sellers internacionais: “Autogestão de Carreira – Você no comando da sua vida”, “Coaching de Carreira – Criando o melhor profissional que se pode ser”, “CARMA – Career And Relationship Management”, “Nut’s Camp – Profissão, caminhos e outras escolhas”, “Inteligência comportamental – A nova fronteira da inteligência emocional”, “Gestão de mudanças aplicada a projetos” (principal literatura sobre o tema nos MBAs do Brasil) e “Shé-Su – Para não esquecer”. Atual CEO da Academia Brasileira de Inteligência comportamental e membro do conselho de administração do Grupo DOMOPAR. No mundo acadêmico coordenou programas de pós-graduação na Universidade Mackenzie, desenvolveu metodologias de behaviorismo junto ao MIT e atuou como professor convidado nas pós-graduações da PUC-RS, FGV, Descomplica e SENAC. Atual patrono do programa de desenvolvimento de carreiras da UNG.
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