Sempre que acontece uma tragédia, muitos perdem a vida, mas não é raro que nos surpreendamos com o fato de que alguns tenham sobrevivido. No grupo dos que sobrevivem, alguns se recuperam rapidamente e conseguem seguir a vida mesmo com as feridas, que vão sendo cuidadas, até que restem apenas cicatrizes. E estas são inevitáveis. Outros, passam a viver uma vida miserável cuja ferida jamais é fechada.
Acidentes e tragédias, vivemos todos nós, pelo menos uma vez na vida. Obviamente, que alguns em maior proporção e outros em menor. Alguns vivem um maremoto, outros um tsunami. Alguns passam por um terremoto de baixa intensidade, mas sofrem um infarto e morrem. Outros, passam por um terremoto de grande intensidade e saem quase que sem um único arranhão. Há os que são vitimas de um furacão e mesmo sendo avisados que ele chegaria, são devastados. E os prevenidos que fortalecem suas propriedades e sofrem mínimos danos. Aos sobreviventes, muitos atribuem milagre.
Na última sexta-feira, dia 04 de maio de 2018, (acho que jamais esquecerei esta data), vivi algo que num primeiro momento, dei o nome de tragédia. O banco para o qual prestava serviço há quase 4 anos como professora e também como Coach, foi interditado pelo Banco Central. Banco onde também minha filha trabalhava como estagiaria há exatos 10 meses e acreditava que seria contratada em breve tamanho sua dedicação, aprendizado e amor pelo que fazia. Uma empresa que na véspera, comemorava seu crescimento. Nos corredores, ouvíamos que estavam todos com sobrecarga de trabalho em função do acréscimo de contas a serem cadastradas e novos investidores aportando dinheiro. O cenário era de que haveria necessidade de aumento do quadro de colaboradores. Da noite para o dia, o banco não existia mais.
E o que isso tem a ver com as tragédias? Se esta não é uma tragédia com danos físicos ou mutiladores, é uma tragédia com danos emocionais de diversas proporções. Não houve perda de vidas nem perda de nenhum membro do corpo. Mas houve perda de perspectiva, de esperança, de confiança… houve mutilação ou mudanças de planos, de sonhos, de objetivos. E como em toda tragédia, quase todos são pegos desprevenidos. Digo quase todos porque o nível de informações e a visão do cenário pode ser diferente dependendo da posição em que cada um está e da percepção da possibilidade iminente de um desastre.
Imagine um ônibus de dois andares lotado. Há passageiros assentados nos bancos da frente, no meio e atrás, na parte de baixo, no mesmo nível do motorista, e os na parte de cima. É claro, que se um caminhão faz uma ultrapassagem proibida, o primeiro a perceber que uma tragédia se aproxima é o motorista e talvez alguns dos passageiros assentados mais à frente. Porém, os que estão atrás serão pegos totalmente desprevenidos. Nenhum deles chegará a seu destino no horário programado. Aliás, muitos não chegarão a seu destino. Outros, sobreviverão.
Neste episódio do banco, me lembrei do acidente das torres gêmeas do World Trade Center e dos depoimentos dos sobreviventes. Muitos chegaram para cumprirem a agenda de trabalho do dia e o prédio estava no chão. Naquela sexta-feira, não cheguei a ir ao Banco porque meu atendimento para um grupo de Coaching seria às 10h e havia sido postergado para a segunda devido ao acúmulo de tarefas de minhas Coachees. Mas praticamente todos os funcionários chegaram pontualmente ao edifício como em qualquer dia “normal” para trabalharem. Naquela mesma manhã, muitos foram imediatamente dispensados. Os novos “chefes” eram funcionários do Banco Central e os diretores não teriam mais nenhuma autoridade. Aquelas pessoas reagiam das mais diversas maneiras: uns desesperados, o choro incontrolável. Outros, petrificados, sem ação nem reação. Alguns, com uma lágrima fina no canto dos olhos sem entender e com uma terrível sensação de impotência.
Como acontece em várias tragédias, por algum motivo que não sabem bem explicar, algumas pessoas não foram trabalhar naquele dia. Minha filha, havia ganhado um bônus do Instituto Brasileiro de Coaching para participar de um treinamento de 3 dias em São Paulo que começaria na manhã, exatamente, do dia 04. Havia pedido um dia de folga e foi dispensada. Por algum motivo, foi tirada do local da tragédia e colocado num espaço com quase 1000 pessoas completamente conectadas numa energia de positividade. O nome do treinamento? “Desperte o seu Poder” com José Roberto Marques. Como uma das sobreviventes, ela teve o privilégio de viver a dor à distância e voltar para a empresa na segunda-feira fortalecida e pronta para viver uma nova fase.
Pessoalmente, reencontrei muitos destes sobreviventes também na segunda-feira. Os relatos sobre o fato são todos iguais. Todos descrevem a mesma cena com muita tristeza, mas a percepção e as emoções são distintas. Em meio aos fatos, há revolta, desespero, indignação, incredulidade, abandono e até gratidão. Entre os sobreviventes, há os que levarão semanas, meses ou talvez até anos para curarem as feridas. Há os que se entregarão e vão esperar que alguém os curem. E, há os que estancarão as feridas imediatamente, sentirão profundamente a dor até porque para limpá-las é preciso cutucá-las, mas as verão secar até que deixem apenas uma leve cicatriz.
Quem sobrevive? Como no caso de um furacão para os moradores da Flórida, por exemplo, hoje sobrevivem os que estão mais preparados. Os que fizeram as adequações aos imóveis e os fortaleceram para resistirem aos fortes ventos. Já no caso de tragédias não anunciadas, que nos pegam desprevenidos, os sobreviventes que conseguem viver a vida na sua plenitude, têm ou desenvolveram características muito comuns.
Os sobreviventes que não apenas sobrevivem, mas se permitem viver são, em primeiro lugar, resilientes. A resiliência é essa capacidade de levarmos um soco (como o boneco que tem saco de areia, João Bobo), de balançar, até de cair, mas de levantar rapidamente. A não vitimização é outra característica forte e comum aos sobreviventes. São pessoas que não se fazem de coitadinhas. São pessoas que percebem que têm muita autoridade e autorresponsabilidade pelos acontecimentos futuros. Isso não quer dizer que não aceitam ajuda. Ao contrário, muitas delas aceitam e pedem ajuda, não como vitimas e se colocando como as pessoas mais desafortunadas do planeta, mas com atitude de quem tem humildade para reconhecer que precisa de ajuda e que com alguém junto a cruz fica mais leve.
Ressignificar a realidade é outra capacidade que os sobreviventes têm maestria. Ressignificar quer dizer que estas pessoas têm a capacidade de dar um novo significado ao fato, entendê-lo como aprendizado ou como livramento. Ressignificar é tirar o foco dos pontos negativos e das perdas que qualquer tragédia causa, sendo capaz de se desapegar, mudar o foco e enxergar a intenção positiva que a tragédia lhes oferece. Ressignificar tem a ver com valores. Se a mansão ou o carro importado que você tinha parecia ser tudo, ressignificar lhe permiti dar valor ao que tem valor incalculável e ninguém pode comprar: a saúde, os amigos, a família e, até, o simples fato de respirar. Me lembro do livro “Pollyanna Menina”, que marcou minha infância, e do filme a “A vida é bela”. Em ambas as histórias, eles conseguiam fazer o jogo do contente e ver beleza onde ninguém mais veria.
E a gratidão. Ah, a gratidão! Como ela é capaz de ativar o sistema de recompensa do cérebro, responsável pela motivação, de liberar dopamina, um importante neurotransmissor que aumenta a sensação de prazer e ainda a oxitocina, conhecida como o hormônio do amor porque estimula o afeto, a empatia, traz tranquilidade e reduz a ansiedade. Os sobreviventes são pessoas que, ao perceberem uma tragédia, são gratos pelo simples fato de terem sobrevivido. São pessoas que percebem que tiveram o melhor, que tudo poderia ter sido pior, e se sentem muito abençoadas. Em geral, pessoas gratas são pessoas que também praticam gestos cotidianos de gentileza, seja um sorriso, um abraço, uma palavra de carinho, uma flor ou até mesmo o servir de forma voluntária
Não sei qual “tragédia” você está vivendo. Pode ser a morte de um ente muito querido, o fim de um relacionamento, a perda de um emprego, o diagnóstico de uma grave doença, um incêndio na sua residência… Também, não sei o tamanho da sua dor e não tenho a receita de uma droga milagrosa que possa lhe prescrever. Como coach e também como uma sobrevivente de algumas tragédias pessoais, posso lhe dizer que vale muito a pena e faz muito bem: não se vitimizar, mas SER O AUTOR DA SUA HISTÓRIA; SER RESILIENTE, RESSIGNIFICAR, SER HUMILDE E PEDIR AJUDA, SER GRATO, PRATICAR A GRATIDÃO E A GENTILEZA.
Participe da Conversa