Vivo em sala de aula ou em auditórios boa parte da minha vida, apoiando pessoas no seu processo de autoconhecimento e transformações pessoais para uma vida mais efetiva, produtiva e feliz. São inúmeros os problemas relacionados à habilidade de comunicação visando melhores resultados em vendas, liderança, atendimento a clientes, apresentações em público, participação em reuniões e, principalmente em os relacionamentos, de modo geral.
Uma das dificuldades apresentadas é a sua dificuldade de dizer não. Apesar de parecer óbvio, há pessoas que sofrem e ficam desconfortáveis quando precisariam dizer não e não dizem, por exemplo, para fazer um favor, ou realizar algo que não gosta.
Aconteceu com uma aluna, seu nome é Ana, participante do nosso curso de Comunicação Verbal, em uma conversa inicial sobre ajustes de expectativas, Ana disse que precisava aprender a dizer não, pois vivia sobrecarregada de atividades que não eram de sua responsabilidade, sobrava pouco tempo para si, levava trabalho para casa para ajudar a algum colega que lhe tinha pedido algo para fazer. Como não sabia dizer não, sentia-se frustrada, cansada e o pior, mesmo fazendo um favor, nem sempre lhe agradeciam.
Sabia que precisava aprender a dizer não, prometia a si mesma que diria um sonoro “NÃO”, mas ele ficava enroscado na garganta, e lá novamente ia a Ana fazer mais uma atividade que não era a sua ou prestar um favor a alguém.
O início do curso estava bem agradável e, nesse clima, perguntei à Ana:
– Você quer mesmo aprender a dizer não?
– Sim, ela disse.
– Se eu te pedir para fazer um exercício agora, topa fazer?
– Sim, claro (era até lógico e a resposta era a esperada).
– Repita comigo, então: “Não”, eu disse com voz firme, som claro e em alto volume.
– “Não”, ela respondeu e riu.
Disse então a ela que o “não” ela já sabia dizer, precisando apenas fazer alguns ajustes de como e quando, firmando um pacto de que eu a estimularia a isso e ela faria os exercícios e o esforço para as mudanças que desejava.
Propus utilizar um recurso para transformações pessoais, a Metodologia F.A.L.A.R., que é um acróstico que significa: F: Finalidade, A: Análise, L: Lapidação, A: Avaliação e R: Resultado.
De início, Ana definiu claramente a primeira etapa – F – Finalidade, ou seja, o estabelecimento do objetivo, evidenciando o que queria, vendo-se dizendo “não”, tendo mais tempo livre, ficando bem consigo mesma e também quando isso começaria a acontecer.
– É isso mesmo que você quer? Perguntei a ela, com a intenção de deixar bem claro que de nada adianta definirmos uma meta se não estamos comprometidos em atingi-la.
– Sim, é, disse Ana. E desse modo iniciou-se o processo de mudanças.
Na sequência, avançamos para o próximo passo que foi a A – Análise, ou seja, uma breve investigação da origem dessa dificuldade, relembrando situações em que ficou frustrada em fazer algo que não desejava. Ajudando-a com perguntas e algumas provocações, ela chegou à seguinte conclusão sobre a origem dessas dificuldades:
– Conflito interno e dificuldade para explicar o porquê do ‘não”;
– Querer agradar o tempo todo, procurando mostrar que era uma pessoa boa;
– Dificuldade de contrariar;
Timidez diante do confronto e por não saber expressar a sua vontade;
– Evitar destacar-se, de algum modo, tendo que assumir a responsabilidade de contestar alguém e impor a sua vontade;
– Pensava que dizer não agredia ou ofendia as outras pessoas;
– Sua crença desde pequena é de que tinha que servir, ajudar e ser ”boazinha” para os outros;
– Era mais fácil dizer sim do que não.
Nessa altura, poderíamos partir para a próxima etapa da metodologia FALAR – a fase da L- Lapidação.
Lapidar significa agir, pôr a mão na massa, fazer acontecer, treinar, praticar, aprender e mudar.
Comecei com um questionamento propondo uma tomada de consciência de que não é porque ela ao dizer não perderia a amizade ou a atenção ou o afeto das outras pessoas. Perguntas simples, do tipo:
– Já houve casos na sua vida em que você disse não e manteve a amizade com outras pessoas?
– Cite algumas situações nas quais teve que dizer não e não se sentiu culpada por isso.
Além disso, pedi a ela que relacionasse os benefícios que teria ao fazer a escolha e praticar dizer não. No início foi difícil, porque o sim estava mais habituado a se fazer presente do que o não, mas devagar foram saindo algumas ideias que culminaram na seguinte relação:
– Satisfação por sentir-se dona da sua própria vida, fazendo escolhas e tomando decisões.
– A percepção de que não tinha que agradar as outras pessoas e não se sentindo culpada nem aborrecida com isso e, mais ainda, continuando a ser amada pelas pessoas queridas.
– O não poderia ser dito de maneira gentil e amorosa, com firmeza e assertividade, olhando nos olhos do interlocutor.
– Teria mais tempo para suas próprias coisas.
– Não mais precisaria desculpar-se por escolher dizer não e dizer o que preferiria.
– Progredir, dando novos significados aos programas aprendidos na infância e que se repetiram automaticamente ao longo do tempo.
– Sentir-se mais livre, com mais tempo e mais feliz.
A partir da tomada dessa consciência, bastava colocar em prática, ou seja, treinar. Foi proposto e combinamos que iniciaria com os nãos mais simples, do tipo rejeitar uma oferta, agradecer por uma insistência, mas manter o seu não. Com o tempo, foi assumindo mais firmemente a sua identidade e personalidade e desenvolveu a capacidade assertiva para olhar nos olhos de quem estava fazendo um pedido e dizer que não tinha tempo, que tinha outras responsabilidades para cumprir e não faria o que estava sendo solicitado.
As fases seguintes da metodologia A- Avaliação e R- Resultado já estavam implícitas no seu processo de mudanças, pois as evidências da transformação ocorreram com a tomada de consciência, mudança de hábitos e a cristalização dessa nova fase na sua atuação diária no trabalho e na vida pessoal.
Houve sim algumas recaídas, Ana disse e, de vez em quando, ainda deixa prevalecer o seu lado de bondade e generosidade, só que com outro padrão de percepção e consciência, afinal de contas passou a segurar firmemente as rédeas da sua própria vida e os ‘’sins’’ e nãos passaram a ser opções conscientes, fazendo escolhas e tomando decisões precisas e de acordo com o seu jeito de ser e de pensar.
Para finalizar, te convido à reflexão: Como você lida com isso? Quantas vezes disse sim, querendo dizer não e também, quantas vezes disse não querendo dizer sim?
Reinaldo Passadori
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