Mascarados e o olhar
Como há coisas que passam despercebidas…
Nós precisamos de indícios materiais, precisamos de um sorriso, de um abraço, de um aperto de mão, de gestos, de corpo.
Quantas vezes acabamos tirando conclusões sobre o que vemos. São inúmeras as vezes em que as ações mostram significados e, pior ainda, mostram conclusões.
Sabemos que não é a melhor forma de nos comunicarmos, mas continuamos insistindo em achar que sabemos através de indicadores concretos.
A palavra em segundo plano não é novidade, mas a cada dia e cada vez mais é com ela que podemos contar.
Estamos falando de linguagem.
Notem como há pessoas que contam muito mais com o corpo como expressão do que sabem, pensam e sentem, do que com a palavra. Estamos falando sobre uma forma de linguagem.
Nossa forma de nos expressar e o olhar passaram a ter uma outra dimensão. Olhamos nos olhos ou não!
Para muitas pessoas essa ação já era um desafio. Desviar o olhar era uma ação automática e revelava para elas sensações e sentimentos, outras nem percebiam como agiam e sentiam.
Agora, nosso sorriso está encoberto. Nossas mãos não podem tocar. Nosso braço e abraço estão a metros (literalmente) de distância.
Além das nossas expressões, nossas emoções estão contidas. Estamos segurando (mais do que nunca) dentro do peito, na cabeça e porque não dizer na alma, tantos sentimentos.
Precisamos usar nosso sorriso sim para demonstrar talvez em um franzido no canto dos olhos nossa alegria e agradecimento por algo. E quem sabe uma testa marcada também nos ajudará a demonstrar o espanto.
O fato é que para além desses recursos (mais do que nunca, insisto) precisamos aprender a falar. A dizer o que estamos sentindo, o que precisamos, o que queremos, o que não podemos mais suportar.
Parece tão simples dizer que precisamos aprender a falar. Talvez algum leitor se pergunte, “mas não aprendemos a falar quando somos crianças?”. Eu respondo: nem sempre.
Entramos na linguagem, e junto com ela na civilização, mas muitas coisas acontecem nesse processo. Uma delas é a contenção de sentidos e emoções.
Atualmente precisamos nos munir de máscaras (físicas) e estamos contidos. Não só afastados socialmente permanecendo em casa (os que podem), mas também nos afastando de sentir.
Talvez, e tomara que seja assim, tudo o que estamos passando em relação a essa pandemia, nos mostre um novo olhar sobre olhar nos olhos, sobre realmente mostrar-se e entender o que os outros também estão tentando mostrar (sobre tudo, inclusive, e mais importante ainda, de si mesmo).
Temos uma possibilidade, talvez única, de aprender a estar com outra pessoa e sentir o valor que isso possa ter, de ter saudade de receber um sorriso. Ao mesmo tempo, de aprender a interpretar um sorriso que nos foi dado através de um olhar. E mais ainda a oportunidade de usar e perceber o poder da palavra, dessa linguagem que nos foi dada e que é tão cara quando bem empregada e empenhada para uma boa causa.
Vamos usar então nossas palavras com o valor que elas têm, com respeito pelos outros e por nós mesmos, e nossas máscaras (físicas ou não) terão menos efeito devastador.
Rosângela Claudino
http://provoca.com.br/
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