Tudo muda o tempo todo e parece que a cada dia, desde o início da pandemia, o “tudo” é mais abrangente e mais rápido. O que já acontecia numa velocidade difícil de acompanhar, agora não tem mais como interagir. Veja que somente 3 entre as 10 maiores empresas de 2010, continuam liderando o ranking 500 Global Brand Finance de 2020. Muitas perderam lugar e outras deixaram de existir porque não conseguiram perceber a tempo de se adaptarem às mudanças, que já estavam ultrapassadas.
O nosso cenário atual é tão desafiador que definitivamente não temos como saber exatamente como será o formato final. Do trabalho, da saúde, do cotidiano nas cidades, da educação ou dos negócios. Sequer se existe mesmo a possibilidade de um formato final.
Esta coluna já comentou antes sobre as mudanças e como lidar com elas. Entretanto, o assunto é tão vasto que poderia escrever por muito tempo sobre o mesmo tema, sem conseguir esgotar o assunto.
A quarentena e o tempo que as pessoas têm passado em casa trazem reflexões sobre o tempo despendido no deslocamento para atividades. E também uma onda crítica sobre aquecimento global, que pode trazer consequências ainda mais graves do que a atual. A redução no consumo de combustíveis fósseis deve ter efeito mais permanente, com menor uso de automóveis.
Outro efeito que tende a perdurar é evitar contatos em espaços públicos, em locais de grande aglomeração. As pessoas passam a ficar mais tempo dentro de casa e serem mais criteriosas na escolha de suas opções ao saírem. As casas tendem a ser maiores, já que as pessoas ficam mais tempo nelas, tanto por suas escolhas quanto pelo home office.
Apenas este tópico já seria bastante relevante em uma acalorada discussão sobre o que se convencionou chamar de novo normal.
Estas mudanças de comportamento certamente terão reflexos muito amplos na estrutura das cidades e nas decisões familiares. Reflexos sobre onde morar, o que é prioridade, relações pessoais, a maneira como se cuidam e assim por diante.
Com a certeza de que será um “longo” e profundo aprendizado. Temos a multiplicidade de canais e novas tecnologias – que por serem novas e em desenvolvimento, mudam todos os dias.
Mudar não é um processo natural para as empresas e cidades. E, claro, também não é para nós seres humanos que tomamos todas as decisões em nome delas. Fomos configurados naturalmente para vivermos em zonas de conforto, economizando energia cerebral. Seguir padrões que nos poupam esforços para processar novas informações. Assim como nos mostra, por exemplo, o livro O poder do hábito, de Charles Duhigg, entre tantos outros estudos. Fomos programados para gostar dos caminhos mais curtos, dos trabalhos mais fáceis e das soluções mais rápidas.
Estamos presenciando modificações culturais, políticas, tecnológicas e organizacionais o tempo todo. E no mundo corporativo as mudanças seguem ditando as transformações, resultando em diferentes demandas, exigências profissionais e novas posições de trabalho. As pessoas proativas e melhor preparadas para lidar com as mudanças instáveis e contínuas conseguem se encaixar com um pouco menos de sacrifício. Já as pessoas com perfis mais afeitos a rotinas e tarefas repetitivas, terão maiores dificuldades. Vão demandar maior esforço de si mesmas para seus desafios sociais, familiares, cargos e funções, que podem não existir mais a partir de amanhã.
Quando não temos referência externa, precisamos aprender a pensar sobre o futuro que queremos. Pensar, dentro de nós mesmos, para termos a visão do que queremos independentemente do mundo externo. E entendermos o que vamos mudar. Não estou falando aqui de mudança caótica, aquele tipo que somos obrigados a processar para sobreviver ao caos. Estou falando de mudança planejada, daquele tipo que conversa com o nosso desejo de sair da crise em uma condição melhor do que entramos.
Para nos mantermos abertos às mudanças, precisamos entender que temos de reeducar nosso cérebro para que ele possa aproveitar outras capacidades. Por exemplo: a curiosidade e o ímpeto por novas descobertas. E, para tanto, precisamos nos conhecer profundamente.
Não somos apenas um conjunto de dados de um formulário técnico. O ser humano tem capacidades infinitas de aprender e de se adaptar. O problema é que se não nos conhecemos o suficiente, não nos empenhamos com o foco que a mudança demanda. Talvez venha daí a criatividade humana.
Como quase tudo na vida, a mudança não é necessariamente o problema. Como lidamos com o problema é tudo. Neste momento da nossa civilização – lidar com as mudanças é o nosso cotidiano. E o será ainda por mais tempo do que possamos tentar arriscar. Certamente teremos no curto prazo o desdobramento desta primeira fase da crise conhecida como Covid-19.
Na sequência, deveremos ter ainda as primeiras grandes mudanças comportamentais das pessoas reformulando a estrutura da vida em sociedade. Isto muda o cenário urbano superficialmente falando para 2020-início 2021. Sempre que somos invadidos por uma sensação de “perda do controle” somos levados ao “boicote” de ações para que nada mude. A menção ao novo normal é uma tentativa de dizer que já sabemos o que e como será a nossa nova vida. Como tudo o que tem acontecido neste novo século, será uma fase rápida. E em seguida vem a consequência da tomada de consciência de que não temos mais um padrão a seguir. As nossas novas decisões serão testadas e rejeitadas ou aceitas para uma sociedade que ainda não conhecemos.
Ante o cenário dinâmico em que vivemos, o desejo de inovar e destacar-se cede lugar ao receio de errar. Como se houvesse um ponto de partida fixo para o julgamento. Não temos. Podemos fazer isso traçando relações de custo-benefício favorável. Mensurar o esforço que vamos empregar versus a tranquilidade e os ganhos que poderemos ter em nosso futuro pessoal e profissional.
Podemos ampliar nossa visão de oportunidades, nos transformando em agentes de mudança.
Para isso é importante entender todo o processo percorrido para encurtar as distâncias. Fazer a transição entre a mudança que acontece fora da gente, e como respondemos internamente à ela. Assim podemos aproveitar nosso sentimento de insatisfação com o status quo. E mudar as coisas a partir de nosso papel na sociedade ou de nosso próprio crescimento individual. Para quem tem o desejo de crescer, a mudança sempre traz oportunidades, a partir da reestruturação.
Todos nós passamos por esse caminho, pois estamos em curva de mudança o tempo todo. Mudança sempre é processo. Nunca encará-lo como um ponto de chegada estático e imutável. Você provavelmente já ouviu muito este conjunto de afirmações. De fato o nosso corpo e o nosso cérebro estão, todos os dias em mutação, desde o momento da concepção. A natureza da vida na Terra sempre foi conhecida. As regras coletivas e individuais estão assimiladas pelo nosso DNA. O instinto de sobrevivência é latente e vai nos garantir perceber os riscos à nossa sobrevivência.
Então, por que tanta importância a este momento da história humana?
Porque nunca houve tanto conhecimento acumulado, registrado e acessível; porque depois do fogo, das linhas de montagem e da energia elétrica – finalmente – alcançamos o patamar do viver acima do sobreviver. E porque finalmente percebemos que a humanidade, com tantas diferenças, não conseguirá mais espaço para existir. Ou seja, o que nos afeta hoje é a necessidade de todos terem uma casa, direito à educação, água limpa e alimento necessário à subsistência; se eu tenho e você não tem, o risco é igual – em todos os sentidos, não só em relação a um vírus.
O medo é o estado emocional mais presente quando enfrentamos uma situação de mudança; por este motivo, se queremos facilitar a transformação, não devemos gerar mais medo no processo. Precisamos de ações que promovam um ambiente seguro, minimizando desconfianças e insatisfações por meio de diálogos e transparência.
Assim, o papel da liderança inclusiva no processo de mudança mostra-se essencial. Um líder que dá voz a seus liderados, cria times coesos. E por isso encontra aliados em todos os níveis da sociedade, da família, das organizações. No mundo, as mudanças ocorrem mais facilmente quando começam de “cima para baixo”. E se realizam com sucesso quando são reforçadas por “agentes” de mudança que promovem a sustentação de “baixo para cima”.
Sandra Moraes
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