DNA – O quanto ele define o que podemos mudar?
Algumas pessoas sucumbem frente aos menores obstáculos da vida. Outras parecem ter uma resistência acima da média para todas as dores físicas e emocionais. Até mesmo para conseguirem reagir e fazer o que parece ninguém mais conseguiria. A raiz de tal resistência pode estar, em partes, em um gene de uma proteína que regula a serotonina. (Um mensageiro do cérebro que tem sido associado com altos e baixos níveis emocionais). O gene chamado SERT codifica a proteína que compõe o transportador de serotonina.
As capacidades de um ser humano podem, e são muitas vezes, desenvolvidas – ou seja a pessoa não nasceu com uma habilidade que escolheu ter. Então será desenvolvida. As pessoas trazem um conjunto inato de características e a partir delas, desenvolve tantas outras. Mas, o fato é que o tempo de aprendizagem pode ser muito grande e os resultados, podem não ser o esperado
Há 50 anos a revista Nature publicava, no número de 25 de abril de 1953, o artigo de James Watson e Francis Crick no qual a estrutura tridimensional do sal do ácido desoxirribonucléico (DNA) era apresentada. Eram duas páginas em que a primeira sentença começava:
“Nós gostaríamos de sugerir uma estrutura para o sal do ácido desoxirribonucléico. Esta estrutura tem características inéditas que são de considerável interesse biológico”.
E terminava com:
“Não nos escapou que o pareamento específico (de bases) que nós postulamos sugere imediatamente um possível mecanismo de cópia para o material genético”.
Esta última sentença tem sido considerada como sendo uma das mais falsamente modestas da literatura científica. No final da década de 1980, Watson liderou o início do projeto de sequenciamento do genoma humano.
Por que essa descoberta despertou tão efusivos entusiasmo e encantamento, ao longo dos anos que se seguiram?
Watson diz em seu livro Dupla Hélice que foi a maior descoberta da biologia desde a teoria da evolução, de Darwin. Por outro lado, Crick, no dia da concepção da estrutura, entrou num pub, no campus da Universidade de Cambridge, gritando: “Descobrimos o segredo da vida!”. O que levou à unicidade dessa descoberta? Provavelmente foi um conjunto de fatores, com uma probabilidade muito pequena de novamente ocorrer e que misturou ciência com aventura e arte.
Atualmente, há pesquisas tentando relacionar DNA e várias características, como preguiça, gula e autoestima. Mas as conclusões ainda não são um consenso no meio científico. O primeiro estudo desse tipo começou em 1979. Pesquisadores na Universidade de Minnesota analisaram o sangue, as ondas cerebrais, a inteligência e as alergias de 350 duplas de gêmeos fraternos e univitelinos, criados na mesma casa ou em lares separados. Em 1986, publicaram o resultado: gêmeos idênticos (com o mesmo DNA) apresentaram o dobro de características similares do que os gêmeos dizigóticos (que dividem metade do mesmo código genético). Concluiu-se que a hereditariedade influenciaria em mais de 50%, deixando o restante dividido entre criação dos pais, ambiente e experiências de vida. Uma extensão da pesquisa oito anos depois, contudo, reviu esse valor para 40%
Tudo o que sabemos, até o momento, ainda está um pouco longe de nos guiar para respostas diretas sobre o tema: DNA x Conhecimento x Aprendizagem x Adaptação e Inteligência. Mas estamos evoluindo a passos rápidos.
Bilhões de pessoas poderão ser expulsas do mercado de trabalho e se transformar em uma classe de humanos irrelevantes em consequência da fusão da biotecnologia e da tecnologia, diz Harari[i]. Os algoritmos, sem o auxílio do DNA – talvez consigam compreender as pessoas melhor que elas mesmas – considera que ainda há tempo para fazer escolhas. No momento, diz, não estamos fazendo as melhores opções. Em vez de responder às nossas necessidades de longo prazo, o desenvolvimento de nossas habilidades hoje se dá em função das necessidades do sistema econômico e político.
“O verdadeiro problema com robôs não está em sua inteligência artificial, mas na estupidez e crueldade naturais de seus senhores humanos.”
Os maiores desafios que enfrentamos são as mudanças climáticas e a ruptura tecnológica. Se as mudanças climáticas não destruírem a civilização humana, a inteligência artificial e a bioengenharia provavelmente nos darão poderes divinos de criação. Até 2100 provavelmente começaremos a criar formas de vida completamente novas. Isso poderá acontecer de três maneiras. A primeira é o uso da engenharia biológica para criação de novos tipos de seres orgânicos, ou seja, reprogramar o DNA humano para criar humanos mais inteligentes e de vida mais longa. A segunda é mais radical. Em vez de se limitarem a trabalhar com estruturas orgânicas, os designers do futuro também poderão usar partes inorgânicas e criar cyborgs, com partes orgânicas e inorgânicas, como humanos com mãos e olhos biônicos. Por fim, os designers poderão criar seres totalmente não orgânicos.
Claro que a esta altura a discussão sobre a capacidade herdada impressa no nosso DNA, atribuído no nascimento e as possibilidades e desejo de aprendizagem não farão mais sentido. Tudo poderá sr ajustado.
Assim, creio que vivemos um tempo em que a discussão sobre as habilidades inatas e aprendidas e seus resultados seja efêmera. E por pouco tempo será inútil.
Os medos e fobias que o ser humano declara frente ao avanço da tecnologia, continuam se baseando nos medos e fobias atuais – sem a tecnologia. Seguiremos avançando. As próximas gerações poderão desfrutar de avanços que os afastem de doenças incuráveis, viver sem habilidades fundamentais a existência humana. Nunca mais viver sem enxergar, sem andar, sem aprender, sem desfrutar de uma vida plena.
Gostou do artigo? Quer saber mais sobre quanto o DNA define o que podemos mudar? Quer saber mais? Então entre em contato comigo. Terei o maior prazer em responder.
Sandra Moraes
https:// www.linkedin.com/in/sandra-balbino-moraes
[i] PhD em história pela Universidade de Oxford e professor de história na Universidade Hebraica de Jerusalém
Confira também: Comportamento Coletivo: O Trauma e as Sequelas da Pandemia
Participe da Conversa