A responsabilidade social das mídias digitais no avanço da pauta DE&I (Diversity, Equity & Inclusion)
Dia 21 de março é o Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial, data criada pela ONU em referência ao Massacre de Sharpeville, na África do Sul. No Brasil, considerando o imenso abismo que pessoas não brancas ainda enfrentam para acessar direitos e oportunidades, é uma data de muita reflexão. E mesmo diante dessa realidade, na mesma semana, surge a polêmica de uma vaga que dava prioridade, na seleção, a pessoas negras e indígenas sendo retirada do ar pela rede social LinkedIn. O assunto esquentou e o clima está tenso. Vamos entender mais sobre o caso?
Sabemos que a desigualdade racial no mercado de trabalho brasileiro é histórica. Segundo dados oficiais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Ministério da Economia, a condição se acentuou diante da crise provocada pela pandemia do novo coronavírus.
Os profissionais pretos e pardos, que representam mais da metade da população do país (56,8%) foram os mais prejudicados pelos efeitos da crise no mercado de trabalho, principalmente os pretos.
Os dados apontam que o desemprego aumentou mais entre os pretos, a taxa de desemprego entre os pretos foi mais expressiva que entre os demais e que a remuneração dos pretos é menor que a dos demais em todos os segmentos.
Se nada for feito, o Brasil vai demorar 150 anos para zerar a desigualdade racial no mercado de trabalho. Diante dessa realidade, ações afirmativas são ferramentas importantes para oferecer acesso aos grupos discriminados.
Por isso, a criação de processos seletivos exclusivos para pessoas negras é uma forma de eliminar as desigualdades historicamente acumuladas, garantindo oportunidades de desenvolvimento de carreira para pessoas negras.
A consciência de líderes e empresários sobre a importância da igualdade racial foi acelerada em 2020 após o assassinato de George Floyd nos Estados Unidos da América e de Joao Alberto em um estacionamento do Carrefour no Brasil.
Nesse mesmo ano, a rede de lojas Magazine Luiza realizou o primeiro programa de trainee voltado exclusivamente para pessoas negras no Brasil. A iniciativa causou controvérsia e foi parar na Justiça do Trabalho. Acusada de discriminatória, após avaliação da maioria dos especialistas ouvidos pela ConJur, a ação foi considerada constitucional e não pôde ser enquadrada na Lei contra o Racismo.
Após o posicionamento firme da Magalu, outras empresas começaram a investir em ações afirmativas para a contratação de trainees e estagiários negros e a própria varejista repetiu a dose em 2021, com sucesso.
Contudo, apesar de essencial para a aceleração da igualdade racial no mercado de trabalho, essa semana a rede social LinkedIn vai na contramão das vagas afirmativas. O caso chegou ao conhecimento público no último final de semana, depois que um anúncio criado pelo Laut (Centro de Análise da Liberdade e do Autoritarismo), que estava priorizando esses grupos subrepresentados em seu processo seletivo, ter sido derrubado pelo LinkedIn.
Ao ser questionada por usuários apoiadores da causa antirracista, o LinkedIn manteve o posicionamento, justificado com base na sua política de não discriminação. O LinkedIn afirma que suas políticas são detalhadas, transparentes e aplicadas a todos os usuários da plataforma em todo o mundo, e que parte do entendimento de que pessoas com os mesmos talentos devem ter acesso às mesmas oportunidades.
A polêmica foi tanta que o MPF (Ministério Público Federal) e o Procon-SP solicitaram informações à plataforma LinkedIn sobre a exclusão. De acordo com o MPF, a decisão da plataforma contraria esforços realizados no Brasil para a inclusão de minorias por meio de ações afirmativas e o LinkedIn deverá esclarecer qual regra norteou a remoção do anúncio, detalhando seus fundamentos jurídicos, no prazo de dez dias úteis contados a partir de 23 de março.
Além dos órgãos citados, a Iniciativa Empresarial pela Igualdade Racial, um movimento do setor privado para combater o racismo no ambiente corporativo, se posicionou contra a medida da rede social. O documento foi assinado por mais de 40 grandes empresas como a própria Magalu, o Grupo Pão de Açúcar, a Ambev, a Bayer, o Santander e a Unilever.
A pauta da igualdade racial é apontada por especialistas em diversidade como a mais desafiadora no Brasil, devido ao mito da democracia racial e a todo histórico de violência, traumas e tabus relacionados ao tema.
O posicionamento do LinkedIn, contrário a ações afirmativas que possam acelerar o processo de redução das desigualdades é um retrocesso e pode influenciar negativamente empresas que já temiam enfrentar essa polêmica.
Sabemos que promover a equidade racial no ambiente de trabalho, além de contribuir para a pauta antirracista, é lucrativo. De acordo com um estudo realizado pela consultoria McKinsey & Company, empresas com mais diversidade étnica em cargos executivos têm até 36% mais chances de aumentar o lucro através da inovação, criatividade e produtividade da equipe.
Apesar dos benefícios para as organizações e para a sociedade, essa atitude do LinkedIn reforça os desafios que ainda vamos precisar contornar em busca de igualdade. Por último, gostaria de encerrar esse artigo com uma reflexão do livro A Alma Imoral, do rabino brasileiro Nilton Bonder:
“Há um olhar que sabe discernir o certo do errado e o errado do certo.
Há um olhar que enxerga quando a obediência significa desrespeito e a desobediência representa respeito.
Há um olhar que reconhece os curtos caminhos longos e os longos caminhos curtos.
Há um olhar que desnuda, que não hesita em afirmar que existem fidelidades perversas e traições de grande lealdade.
Este olhar é o da alma.” – A Alma Imoral
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Kaká Rodrigues
https://www.diversidadeagora.com.br
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