Como os leitores já sabem, estamos em avançado processo de estruturação deste espaço para que tenhamos uma dinâmica de debates e aprendizagem, criando ainda mais condições para a construção de competência diferenciada aos Coaches que nos acompanham. Para essa dinâmica acontecer, a participação de cada leitor será incentivada a partir de texto que aponta uma polêmica ou situação conflitante, ainda mais provocativa do que as postagens regulares que fazemos.
Então, já como exercício, mas ainda sem debates, vou explorar um tema que sempre afeta a vida dos profissionais em altos cargos, que é o conflito em aceitar ou não a imposição de um superior para forçar uma decisão. Como você reage? O que você faz se o seu chefe pedir para quebrar as regras? Isso já lhe aconteceu?
Na semana passada, a Harvard Business Review publicou um artigo de Peter Coleman e Robert Ferguson explorando o tema. Afirmam eles que, em algum momento, qualquer profissional será convidado a quebrar as regras no trabalho. Poderá ser uma pequena ação ou uma simples omissão para um assunto em andamento. Poderá ser a solicitação para alterar documentação em um determinado item ou em uma norma. Mas também poderá ser algo bem impactante, como ocorreu com profissionais da Volkswagen, Enron ou outros casos de repercussão internacional (por razões óbvias, poderíamos trazer uma lista infindável de “regras quebradas” no Brasil, desde grandes estatais, passando por fundos de pensão e chegando à falência de empresas privadas).
Segundo os dois autores citados, o conselho-padrão para a gestão desse conflito sugere encontrar soluções do tipo ganha-ganha, ainda que isso pouca chance tenha de funcionar quando há aspectos de natureza ética, moral ou legal em jogo. Como por exemplo, quando a ordem superior envolve fraudes ou relacionamento com criminosos; o evidente risco de lesão pessoal, assédio moral ou sexual, ou ordem para encobrir uma ilegalidade ou ato criminoso. Como um profissional ético, mas bastante dependente do trabalho, pode responder a essas disputas de forma eficaz?
Os autores apostam em uma abordagem que chamaram de “rebelião com princípios”, que implica em alternar a racionalidade e a irracionalidade para não se deixar vencer. Ela implica em aprender a dizer “não”, de forma sistemática e sequencial, retornando o problema e o risco para os superiores. Aqui estão algumas táticas, recolhidoas a partir da literatura sobre ativismo político, que podem ser úteis a quem passar pelo problema:
- O primeiro passo deve ser o de apelar para o auto-interesse do superior, pois pode até ser que ele não tenha conhecimento das implicações daquilo que está determinando. Explore o assunto em termos dos seus custos potenciais e riscos, sinalizando também seu desconforto. Isso dará ao superior a chance de cancelar a ordem sem perder a autoridade, assumindo que a avaliação recebida o fez mudar de opinião;
- Se essa primeira tentativa não deu certo, precisa-se ir um pouco mais fundo no assunto (perder a sutileza). Mostre que, como pessoas decentes que são, não podem ser inconsistentes com outra postura perante a vida. Ao enfatizar o justo e o correto, deve-se lembrar do que poderá acontecer se o resultado da ação não der certo;
- Caso a opção 1 e a 2 não funcionem, apenas diga “não”. O melhor é recusar a ordem, calmamente. Se o que você está sendo solicitado a fazer é claramente antiético, imoral ou ilegal, então a sua recusa sincera pode ser o suficiente para intimidar o superior e fazer com que ele recue e reconsidere a ordem dada;
- Como passo seguinte, diga “não” ainda mais alto se o chefe erguer a voz, pois chegou o momento de amplificar o volume. Isso pode significar falar com amigos e colegas, e obter seus conselhos e apoio. Se isso não for possível sem colocá-los em perigo, então talvez seja o momento de procurar um ombudsman ou alguém confiável da área de recursos humanos;
- Se as táticas de 1 a 4 não funcionaram ou se mostraram sem condições de aplicação, talvez seja o momento de alardear o problema para fora do âmbito da empresa, pois o cenário começa a ser crítico para você e seus colegas. E quanto mais alto for o seu posto, mais a sua voz terá chance de ser aceita, com credibilidade;
- Outra tática possível é mudar a dinâmica de poder no trabalho, reunindo aliados. Isso significa organizar várias pessoas de um departamento para juntos irem a um gerente e, em conjunto, expressarem preocupações com os riscos que a empresa e as pessoas passam a ter com a ordem dada. Em alguns locais, com a possível intervenção sindical, pode-se organizar até paralizações programadas para chamar a atenção pública ao fato.
O artigo cita ainda mais duas táticas que, deliberadamente, preferi não desenvolver, pois chega-se ao limite de se propor a “tomada do poder”. Como o espírito deste espaço é democrático e não revolucionário, eu troco as duas táticas por uma sugestão: caia fora e procure um lugar melhor para dar vida aos seus ideais profissionais!
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