Olá!
Hoje quero falar com você sobre uma coisa bastante obvia, mas que a maioria das pessoas simplesmente desconhece por nunca ter parado para pensar sobe ela. Chamo de a estratégia do jogo de xadrez.
Para melhor compreender de onde vem esta estratégia, preciso falar do seu Florentino. Seu Florentino era um homem simples, nascido na cidade de Pirajuí, interior do Estado de São Paulo, filho de imigrantes italianos e, como tantas outras pessoas em sua condição, acabou por migrar para São Paulo, em busca de melhores condições de vida. Curiosa era a figura do seu Flor, como os amigos costumavam chamá-lo, pois embora fosse de pouco estudo formal, era um homem de muitas letras e estava sempre lendo alguma coisa. Podia ser o jornal do dia, uma revista antiga e até bula de remédio. Mas o forte de seu Flor eram os livros.
Talvez por ser trabalho, na antiga unidade da Light Eletrical and Power em São Paulo, onde ele trabalhava como almoxarife (quando eu o conheci ainda pequeno, eu pensava que ele era xerife) liberando peças de reposição para as equipes de manutenção de lâmpadas e postes pela cidade, seu Flor passava muitas horas no balcão, esperando os caminhões que viriam da rua e nestas horas, literalmente não havia nada para fazer a não ser esperar. Este era o tempo que seu Flor dedicava à leitura de livros e manuais. Um deles, o manual de técnicas de xadrez. Lia, relia, aplicava e treinava com os colegas de almoxarifado.
Minha história se cruza com a de seu Florentino na década de 1960, mas precisamente em sete de agosto de 1966 quando após uma longa espera, Dona Lina, morena bonita no auge de seus vinte e quatro anos, dava a luz a este que agora lhes escreve, vindo a ser o segundo filho de seu Flor, o melhor, do senhor Florentino Carli.
Assim, nossa vida seguiu e como todo o garoto eu adorava ajudar meu pai nos afazeres de casa, desde consertar galinheiros até levantar cercas e, obviamente, jogávamos. Jogávamos de tudo, desde jogos de cartas, dominó e logicamente xadrez. Foi com meu pai que aprendi a jogar xadrez aos quatro anos de idade, muito antes de ser alfabetizado e foi com ele também que aprendi as primeiras letras e palavras, ainda em casa com os livros, gibis e revistas antigas que tínhamos em casa.
Numa destas muitas tardes que passávamos jogando, eu estava muito chateado por não conseguir vencer uma jogada simples de xadrez, embora já estivesse com onze anos de idade e sete de tabuleiros e isto me fazia um jogador razoavelmente graduado.
Vendo que a cada hora eu ficava mais e mais nervoso, meu pai se levantou do sofá de napa verde que fronteava nossa televisão ainda em preto e branco, pegou o tabuleiro que estava sobre a mesa de centro, destas de vime com tampo de vidro e falou: – Vem comigo!
Segui os passos, firmes dele pelo estreito corredor até a cozinha da casa onde ele colocou o tabuleiro sobre a bancada da cozinha e puxou uma cadeira mandando que eu sentasse de forma que o tabuleiro de xadrez ficou na altura dos meus olhos.
– O que você esta vendo? – Perguntou com a voz grossa.
– Estou vendo o tabuleiro! – Respondi com voz de adolescente sabe-tudo.
Com a paciência de um orangotango ele colocou suas mãos pesadas nos meus ombros e olhou comigo agora, com os olhos na altura dos meus.
Percebe que você está vendo o tabuleiro como se fosse uma das peças? Todas estão no mesmo nível dos seus olhos e algumas atrapalham a visão das outras?
– Isto é verdade! – Respondi tentando antecipar a dica que viria.
Ainda com as mãos nos meus ombros ele levantou e me levou junto com ele. Nossa visão agora é superior ao tabuleiro e mostrava toda a situação da jogada a frente.
– Veja agora, com os olhos do jogador. A visão não é mais clara? – Seu Flor parecia perceber que havia entendido.
Nesta tarde de 1977 percebi o que muitos anos depois eu chamaria de a estratégia do jogo de xadrez e que hoje orienta muito de meus passos na gestão de carreira, nos negócios e principalmente nas oficinas do Método CARMA pelo Brasil.
Não basta conhecer as regras do jogo. Saber como cada peça deve se movimentar e ainda antecipar jogadas se em sua mente, você se considera uma das peças do tabuleiro!
O que hoje definimos como distanciamento é a forma como nos colocamos em pé ao lado de uma situação difícil e podemos entender claramente quais os obstáculos que estão à nossa frente (peças do adversário), os diversos caminhos que podemos seguir (casas do tabuleiro), nossas limitações (movimentos de nossas peças) e nossos recursos (as peças que ainda temos).
Assim, meu querido leitor, nasceu a estratégia do jogo de xadrez.
Quando um problema está muito, mas muito complicado, afaste-se dele e pense no cenário como um grande tabuleiro. Você perceberá que coisas claras como:
- Você é o jogador e não uma das peças;
- O jogo pode acabar, mas o dia e a vida continuam;
- Às vezes você precisa sacrificar algum recurso (dinheiro, coisas e até relacionamentos) visando à vitória.
Pessoas, por mais diferentes que sejam entre si, possuem padrões de comportamento, assim como os movimentos das peças de xadrez, entenda este movimento e você controlará o jogo.
Seu Flor nos deixou em 1992, mas suas ideias, seu jeito caipira e sua paixão pela leitura ainda vivem em seus descendentes.
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