A resiliência em tempos de crise!
Em um excelente artigo que foi publicado pela Associação Americana de Psicologia, no último dia 1/4/2020 (postagem completa em http://www.apa.org/topics/resilience), a abertura já é bastante esclarecedora quanto ao conteúdo (versão livre):
A vida pode não mostrar um mapa para a viagem, mas todos sofrerão reviravoltas que começam pelos desafios do cotidiano e passam por eventos traumáticos de impacto mais duradouro, como a morte de um ente querido, um acidente que altera o futuro ou uma doença grave. A mudança decorrente afetará cada pessoa de maneira diferente, com pensamentos, emoções fortes e incertezas que não se repetem da mesma forma. No entanto, ao longo do tempo, podemos nos adaptar a situações estressantes, em parte graças à resiliência.
Continuando, no artigo há uma metáfora curiosa para remeter ao objetivo da postagem. Imagine que você fará uma viagem de canoa por um rio. Juntamente com águas calmas e rasas, seu mapa de viagem mostra que à frente haverá uma sequência de corredeiras e trechos difíceis. Como você pode ter certeza de que poderá atravessar com segurança essas águas agitadas? Como irá lidar com os problemas inesperados decorrentes desse desafio? É claro, você poderá pedir orientação de gente mais experiente para esse tipo de aventura ou confiar na companhia de amigos. Poderá carregar colete salva-vidas extra ou usar uma canoa mais resistente. Com as ferramentas e suportes corretos, uma coisa é certa: você não apenas vencerá os desafios da aventura no rio, mas também sairá dessa experiência com mais coragem e confiança para enfrentar outros futuros desafios.
O artigo publicado pela APA – Associação Americana de Psicologia(*) tem um mérito: ele não só procura organizar o entendimento em torno do tema central (como construir resiliência), mas esclarece “o que é” e “o que não é” resiliência.
Para a APA, “resiliência é a capacidade de adaptação diante de adversidades, traumas, tragédias, ameaças ou fontes significativas de estresse, tais como problemas familiares e de relacionamento, problemas graves de saúde, dificuldades financeiras e conflitos no local de trabalho”. Tornar-se mais resiliente não apenas ajudará a superar circunstâncias difíceis, como também trará crescimento pessoal e uma dinâmica melhor em torno de sua vida.
O artigo esclarece que ser resiliente não significa que a pessoa nunca experimentará dificuldades ou angústias, sendo muito provável que a conquista da resiliência envolverá consideráveis dores ou conflitos emocionais. Resiliência não é necessariamente um traço de personalidade que apenas algumas pessoas possuem. Ao contrário, ela envolve comportamentos e controle emocional que qualquer um pode aprender e desenvolver. Um exemplo clássico e marcante está na resposta dos americanos aos ataques terroristas de 2001, e aos esforços para reconstruírem suas vidas.
O estudo publicado aponta que a construção da resiliência não é algo rápido e banal. Em decorrência, afirma que se uma pessoa colocar foco em ter como bastante saudáveis quatro áreas fundamentais da vida (construir relacionamentos, bem-estar do corpo, pensamento positivo e, ainda, significado ou propósito), isso facilitará na capacidade de suportar e aprender com as futuras experiências difíceis e traumáticas. Além disso, motiva que as pessoas mantenham pronto o espírito de pedir ajuda, quando necessário. Para que esse cenário aconteça, são sugeridas algumas estratégias que valem ser mencionadas (ainda que de forma resumida em relação ao artigo). Muita atenção na leitura e não deixem de fazer boa reflexão, para seu caso em particular:
Priorize relacionamentos
Conectar-se com pessoas compreensivas e confiáveis irá lembrar uma pessoa que ela não está abandonada em meio a dificuldades. Amigos são aqueles que respeitam nossos sentimentos e darão apoio, mesmo nos momentos em que houver uma vontade por algum isolamento. Indo além, é importante participar de grupos com que tenhamos interesses em comum, sejam eles cívicos, religiosos ou em organizações locais de apoio social. Vale também ampliar a conexão com grupos de pesquisa na área de atuação pessoal, ajudando a ampliar o senso de propósito.
Promover bem-estar
Máximo cuidado com o corpo. Isso pode ser entendido como um chavão popular, mas também é uma prática legítima para a saúde mental e a construção de resiliência, pois todo estresse impacta tanto o físico quanto o emocional. A promoção de fatores positivos no estilo de vida, como nutrição, sono, hidratação e exercícios regulares, tudo pode fortalecer o corpo para se adaptar ao estresse e reduzir o risco de emoções negativas, como ansiedade ou depressão.
Outro ponto que o artigo aponta é a prática do que chama “atenção plena”. Ao escrever um diário, meditar ou orar, não deixar também de refletir sobre os aspectos positivos da vida, lembrando-se daquilo que conquistou e pelo que quer agradecer, mesmo durante as provações pessoais. Certamente, pode ser tentador mascarar dificuldades com álcool, drogas ou outros vícios, mas isso será como colocar um curativo em uma ferida profunda. Ao contrário, concentre-se em dar recursos ao corpo para gerenciar o estresse, contra ingenuamente tentar eliminar a sensação de estresse.
Encontrar propósito
Este é um assunto por si só complexo, em que o estudo da APA aborda sob vários aspectos. Um bom começo é aceitar que mudanças existem, fazem parte da vida. Portanto, certas metas ou sonhos podem não mais ser atingíveis como resultado de situações adversas que aconteceram. Aceitar situações de mudanças, que fugiram de nossa capacidade de interferir, pode ajudar a ter mais foco nas circunstâncias em que ainda temos como desenvolver uma ação. Isso motivará ser proativo, promovendo autoconhecimento e procurando entender como enfrentar problemas à frente.
Dica: se um problema parece grande demais para ser resolvido, divida-o em pedaços gerenciáveis.
Outra estratégia é avançar regularmente, e de maneira realista, para os objetivos pessoais. Em vez de se concentrar em tarefas que parecem inatingíveis, procure identificar o que pode realizar hoje e que o ajudará a seguir na direção que deseja. Procure oportunidades de autoconhecimento e autoestima, seja por aproximar-se de quem viveu ou vive problemas similares, ou como voluntário no apoio a amigos e necessitados (exemplos de creches, desabrigados ou lares de pessoas idosas). A perspectiva otimista de vida permite melhor visualizar o que se deseja, sem se preocupar com o que se teme, buscando reconhecer maneiras sutis que trazem bem-estar, mesmo nas dificuldades.
E ainda há outra estratégia fundamental: sempre aprenda com o seu passado pois, dessa forma, saberá quem ou o que lhe foi útil em tempos anteriores de angústia, construindo formas de responder às novas situações difíceis. Lembre-se de onde você conseguiu encontrar forças e se pergunte o que aprendeu com essas experiências, mantendo o que pode enfrentar em perspectiva. Tente identificar áreas do seu pensamento irracional, que geram a tendência de ampliar dificuldades ou em supor que o mundo está à sua disposição, a partir daí adotando um padrão de pensamento equilibrado e realista. Você pode não conseguir modificar um evento altamente estressante, mas pode alterar a maneira como interpretará e responderá a ele.
Procurando ajuda
Obter ajuda quando necessário é crucial para aumentar a resiliência. Muitas pessoas podem acreditar que, ao usar seus próprios recursos e os tipos de estratégias listados acima, terão suficiente base para aumentar sua resiliência. Porém, às vezes, essas pessoas poderão ficar travadas ou terem dificuldades em progredir no caminho da resiliência. Nesse momento, é essencial procurar por algum tipo de ajuda, de preferência profissional. Lembre-se de que diferentes pessoas tendem a se sentir confortáveis com diferentes estilos de interação, sendo fundamental que a pessoa em dificuldade não se sinta abandonada na jornada. Embora alguém possa não conseguir controlar todas as situações estressantes, ela pode crescer sua resiliência concentrando-se nos aspectos dos desafios da vida em que pode gerenciar o caminho, com um apoio em que confie.
Conclusão
Fica aqui meu recado aos amigos leitores: há profissionais que trabalham com intervenção na vida das pessoas (coaches, mentores, consultores, conselheiros, terapeutas, entre outros), os quais precisam ter competências específicas, métodos e, ainda, comportamentos que gerem confiança nos seus clientes. E esses profissionais também precisam estar bem preparados para os momentos desafiadores gerados por um mundo que é volátil, incerto, complexo e ambíguo. Como vimos, criar resiliência vale para todas as pessoas, tanto mais quando vemos tantos a sofrer com crises de estresse, ansiedade, depressão e necessidade de desenvolver autoconfiança, autoestima e uma grande capacidade de reflexão. Pensem nisso, e até nossa próxima postagem!
Mario Divo
https://www.dimensoesdesucesso.com.br/
Confira também: Você tem “Capital Psicológico”!
(*) Eis aqui a lista de autores/colaboradores do estudo publicado: David Palmiter, PhD (Professor of Psychology at Marywood University, Scranton, Penn); Mary Alvord, PhD (Director, Alvord, Baker & Associates, Rockville, Md); Rosalind Dorlen, PsyD (Member: Allied Professional Staff, Department of Psychiatry Overlook Medical Center, Summit, NJ; Senior Faculty, Center for Psychotherapy and Psychoanalysis of New Jersey and Field Supervisor at the Graduate School of Applied and Professional Psychology, Rutgers University); Lillian Comas-Diaz, PhD (Director, Transcultural Mental Health Institute, Washington, D.C.); Suniya S. Luthar, PhD (Teachers College, Columbia University, New York City, N.Y.); Salvatore R. Maddi, PhD (The Hardiness Institute, Inc., University of California at Irvine, Newport Beach, California); H. Katherine (Kit) O’Neill, PhD (North Dakota State University and Knowlton, O’Neill and Associates, Fargo, N.D.); Karen W. Saakvitne, PhD (Traumatic Stress Institute/Center for Adult & Adolescent Psychotherapy, South Windsor, Conn.); Richard Glenn Tedeschi, PhD (Department of Psychology, University of North Carolina at Charlotte).
Participe da Conversa