Estamos de volta pra casa
“Mudaram as estações, nada mudou
Mas eu sei que alguma coisa aconteceu
Tá tudo assim, tão diferente
Se lembra quando a gente
Chegou um dia a acreditar
Que tudo era pra sempre
Sem saber que o pra sempre sempre acaba
….
Mesmo com tantos motivos
Pra deixar tudo como está
Nem desistir nem tentar, agora tanto faz
Estamos indo de volta pra casa.” Cassia Eller – Compositor: Renato Manfredini Junior
É, mudaram as estacões. A pandemia que no Brasil chegou no final do verão, se arrastou durante todo o outono e já se faz presente no inverno sem dar sinais de quando vai embora. Se é que vai embora tão brevemente. Talvez, dure até o próximo verão ou inverno. Quem sabe? Ninguém ainda sabe.
I.N.C.E.R.T.E.Z.A.S hoje fazem parte do nosso dia a dia. Com elas, veem os mais frágeis sentimentos como medo, insegurança, raiva, angústia, desesperança, desânimo…Obviamente, que sentimentos que não são comuns a todas as pessoas, mas à grande maioria. No meio deste caos, uma única certeza: a de que “tá tudo assim tão diferente” e sabemos que “o pra sempre sempre acaba”.
Estamos indo todos (ou quase todos) de volta pra casa.
A divisão de espaço não existe mais e com ela a de tempo parece se anuviar também. O quarto, a cozinha, a sala … viraram nossos escritórios, estúdios, ateliês, academias, refeitórios e fica difícil saber até se o dia é útil ou de final de semana porque todos os dias parecem igualmente úteis ou absurdamente inúteis.
Dizem que precisamos da vitamina D e o máximo que conseguimos fazer, em muitos casos, é colocar um pedacinho do braço na fresta de sol que penetra a janela. Não importa se CLT, servidor(a) público(a) ou empresário(a), todos nós nos tornamos empreendedores e gestores de nossos próprios espaços dentro de casa. A tecnologia alivia, traz mais conforto, diminui distâncias, mas o desafio é gigantesco.
Num ensaio bastante profético, Domenico de Masi, sociólogo italiano, autor de várias livros entre eles o Ócio Criativo, defende que a era pós-industrial seria a era do feminino. Um dos contrapontos apresentados por ele é o local de trabalho da era industrial, principalmente, as fábricas como sendo o espaço do masculino onde os valores eram primeiramente a força, a produção em massa, a obediência, a rigidez dos processos, a conformidade, a supervalorização da razão como algo positivo em contraponto com a emoção, tida como característica do feminino e algo pejorativamente negativo. O local do trabalho era do masculino assim como a “casa” era o local do feminino, da reprodução, do cuidado e majoritariamente da mulher.
De Masi não profetizou esta pandemia, mas já tinha antecipado que os espaços e o tempo de trabalho na era pós-industrial, que hoje chamamos de Indústria 4.0, seriam ressignificados, uma vez que trabalho e lazer se misturariam no espaço e no tempo tornando possível a prática de trabalho em espaços de lazer ou domésticos assim como espaços e momentos de lazer dentro das empresas.
Sob esta perspectiva, a transformação que parece ser apenas física e temporal impacta diretamente na mudança de comportamentos e até de crenças apontando para o fato de que os valores e características mais fortemente dominantes nas mulheres e, portanto, do feminino terão maior peso e influência nos negócios e trabalho.
A volta para casa nos dá, literalmente, a oportunidade de colocarmos em prática os valores que De Masi preconiza como sendo os valores da era pós-industrial e do feminino. A meu ver, a palavra da vez que marca esta pandemia é ADAPTABILIDADE e com ela se acoplam a empatia, resiliência, flexibilidade, criatividade, valorizando a estética, as artes e a compaixão.
Voltamos para casa e podemos dar, a partir dessa volta, um grande passo em direção a um futuro mais feminino na sua humanidade, na construção de relações mais saudáveis e fraternas, despertando nossa criatividade alinhada ao belo, à estética, à ética e à justiça.
Cris Ferreira
https://soucrisferreira.com.br/
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