Há um ditado popular que afirma: “até água em excesso pode matar uma pessoa”. Ou seja, devemos aprender a ter equilíbrio em tudo na vida, ou qualquer exagero pode levar a situações com potencial de descontrole. E uma das situações que tem me incomodado ver está na forma como muitas pessoas se tornaram escravas da tecnologia digital. Não quero aqui dar lição de moral aos leitores, mas, como Coach, abordo o assunto para que cada um reflita sobre a forma com que se relaciona com suas “maquininhas portáteis”: o tablete e o smartphone.
Vou relatar um caso recente que, entre outros, chamou minha atenção e me estimulou a escrever este texto. Era um dia de semana comum e, em meio a uma série de compromissos, decidi comer em um restaurante japonês de shopping, com serviço de buffet. O espaço é pequeno e limitado, com não mais que 15 mesas, o que faz com que as pessoas fiquem relativamente próximas após se servirem. Logo depois que eu me sentei, na mesa ao lado sentou-se uma mulher jovem, bem vestida e com não mais de 30 anos.
Quando estou sozinho, eu considero o momento de qualquer refeição como de extrema importância não só pelo fator óbvio da alimentação, mas pela oportunidade de em silêncio conversar com o meu ser interior, e não necessariamente sobre problemas ou pendências. É quando se consegue fazer um exercício de espiritualidade para contribuir com a tão necessária harmonia que se busca na vida. Mas parece que nem todo mundo pensa assim, já que é comum as pessoas estarem conectadas com as “maquininhas” até em elevadores ou banheiros.
Continuando, nem bem se serviu e, de imediato, a minha vizinha de mesa no restaurante japonês tirou da bolsa seu tablete e dois celulares. Entre uma e outra “engolida” de comida (pois nem mastigar direito conseguia), ela pesquisava informações no tablete alternadamente com um frenético clicar no celular. Ao lado, confesso que aquela agitação toda ainda não incomodava, até o momento que entra em ação o segundo celular, agora com viva-voz. Eis que o restaurante se transformou no escritório particular da jovem e não só eu, mas os demais vizinhos da mesa também, todos começamos a ficar nitidamente incomodados.
A preocupação e o respeito às pessoas eram nulos, obrigados que fomos a participar de uma conversa sobre compra de equipamentos, encaminhamento de correspondência, pagamento de fornecedor, cobrança de uma dívida e remarcação de uma reunião. Mas se, por um instante, esquecermos do ambiente externo que cercava aquela jovem mulher, vamos pensar no que estaria acontecendo em seu processo cognitivo, na relação dela com ela mesma. Tenho a absoluta certeza de que não existia a mínima percepção de como sua vida estava sendo dominada pela disponibilidade de tecnologias, de forma que o seu mundo passava a ser orientado pelo externo (as necessidades do meio, do ter e do poder) e não pelo interno (as necessidades do “ser humano”).
Aquela mulher (e tantas outras pessoas como ela) tornou-se inseparável de suas maquininhas digitais, sendo que isso por si só não é o ponto crítico que eu quero polemizar. Quero é chamar a atenção do leitor para uma nítida relação de dependência até mesmo existencial, quando a prioridade do “ser humano” é estar conectado com algo ou alguém, ao invés de ter a prioridade na busca de equilíbrio e autorreflexão, em todos os aspectos.
E assim como o viciado em alguma droga química desliga-se da capacidade de controlar-se no consumo, a tecnologia em excesso tem se transformado em uma droga que faz mal da mesma forma a exigir atenção e cuidados. Os impactos na saúde mental e física são silenciosos, mas podem ser arrasadores ao longo do tempo. Principalmente se, em meio ao dia a dia dinâmico que temos, o escravo da tecnologia se alienar de quem está ao seu lado, seja ele um familiar, um amigo ou mesmo um desconhecido da mesa do restaurante.
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