Sentada no sofá da sala a menina assistia aos desenhos da TV Cultura. As imagens que vinham na TV se misturavam com os cheiros de janta sendo preparada na cozinha. A repetição dessa sinestesia caracterizava as tardes na casa da avó da menina, acompanhadas do som do sino da igreja que tocava religiosamente às seis da tarde.
Mas era diferente em algumas tardes. A avó, a pedido da neta, pegava sua varinha de condão e levava a neta a experimentar outra sinestesia. A sinestesia causada pelo som que saia da boca da avó junto a seu hálito perfumado de temperos usados para preparar a janta. Sua varinha de condão eram as palavras. Palavras escritas em um pedaço de papel; elas magicamente obedeciam à avó e iam pintando todo o cenário na tela em branco da imaginação da neta. O cenário que a neta mais gostava era o cenário bucólico das historinhas do personagem Chico Bento, da Turma da Mônica. Quanto mais a avó dizia as falas do personagem com sotaque interiorano, mais colorido o cenário ficava e mais a neta viajava por aquele mundo das letras.
Depois de repetidas tardes mágicas, essa neta aprendeu a viajar sozinha pelo mundo das letras. E encontrar nele calma, segurança, lembranças e um portal. Portal para sair desse mundo material e ir direto para um mundo onde tudo é possível. Basta uma folha e um lápis.
Resolvi contar essa história biográfica essa semana por vários motivos. Mas os motivos que atingem o objetivo da coluna são: uma possível resposta do porquê a taxa de leitura é tão baixa entre nós jovens. E porque a leitura na vida de qualquer pessoa é tão importante.
Acredito que a taxa de leitura seja baixa, pois além de nem todos terem uma avó bruxa boa como a minha, não há incentivo à leitura ou quando se tem ela não é apresentada às crianças de um modo que motive ou interesse.
E sim para todas as pessoas, mas principalmente nós jovens, a leitura é muito importante. Seja ela feita no papel ou por uma tela de celular ou computador. Principalmente para nós jovens, pois estamos na nossa melhor fase de absorção e principalmente praticar aquilo que se é absorvido da teoria.
Vó, muito obrigada por me iniciar e me mostrar o mundo das letras de um jeito que eu me encantei. E de um jeito que eu poderei sempre te recordar e ouvir o tom de sua voz a cada letra pronunciada. Te amo eternamente!
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