Em 1998, os professores William Jenkins e Richard Oliver, ambos da centenária Universidade Vanderbilt (Tennessee – EUA), criaram uma história de suspense leve, com leitura agradável, e voltada a estimular uma reflexão sobre como ser bem-sucedido no Século XXI. Na forma de uma parábola, lançaram “A águia e o monge”, um livro que tem como ponto focal o conceito de mudança, força fundamental e inalterável muito presente nos tempos atuais. Indo além, o texto explica que devemos modificar a compreensão e a aceitação das mudanças em nossas vidas, seja como indivíduos, famílias e organizações, bem como países e blocos.
Farei um resumo da história de forma a desenvolver meu interesse para a postagem, mas recomendo a leitura para reflexão mais ampla sobre o conteúdo. Resumidamente, a história se passa em uma ilha isolada, em que se encontram a águia e o monge, protegidos por uma árvore bonita e frutífera, oferecendo um alimento muito saboroso. A águia se posta no mais alto da árvore e o monge à sombra. Os dois desenvolvem uma rápida amizade, e essa tranquilidade inicial fica ameaçada por um temporal que se aproxima. A águia teria como voar para longe, mas o monge está desesperançado por não ter para que lado fugir.
Um vento mais forte derruba um galho da árvore e fere a águia em sua asa. O monge se dispõe a ajudá-la, mas surge então a desconfiança: como uma águia poderia confiar em alguém que acabara de conhecer, mesmo isso sendo necessário? Afinal, que provas o monge teria dado para isso? Enquanto isso, subia a maré e aumentava a tempestade, dificultando até mesmo a conversa entre ambos. Para o monge, a questão tinha outra abordagem, pois o normal é confiar nas pessoas de seu grupo (outros monges), não sendo difícil estender a outros. Enfim, após algumas peripécias, ambos começam a construir uma muralha de pedras para se defenderem, conquistando a ajuda de tartarugas marinhas na empreitada.
Saindo só um pouco da fábula, para fazer um paralelo com nossas vidas, aquele até então calmo local, agradável e seguro, começou a sofrer uma transformação brusca, incorporando conceitos de volatilidade, incertezas, complexidade e ambiguidade. Um verdadeiro ambiente VUCA para ser vencido pelo monge conservador, uma águia despreparada para sua impotência em voar, a tartaruga sábia que morre na praia e as tartaruguinhas que seguiram caminho para outros lugares. E o enfrentamento para essa mudança gerou a ideia de se construir a muralha, que não resistiu ao primeiro impacto da onda mais forte.
Tentaram construir um ninho no alto da árvore, grande o suficiente para a águia e o monge, mas a força dos ventos derrubou o ninho e ambos se estatelaram no chão. Apesar de tudo, a árvore resistia a essa tempestade, mesmo perdendo galhos e folhas. A águia e o monge tentavam entender a última frase da tartaruga: “procure a sabedoria da árvore”, e conjecturavam que a começar da semente, forma muitos elementos da natureza que trabalharam juntos para formar aquela árvore. Houve sinergia em equipe, envolvendo todas as forças naturais, com cada qual desempenhando efetivamente seu papel.
Aliás, muitas das palavras da sábia tartaruga ainda entoavam dúvidas para a águia e o monge. Disse ela que aquela tempestade, forte e inesperada, não era sinal de que o vento fosse mau. A destruição de parte da ilha e da muralha forçavam a que a águia e o monge deixassem de lado velhas ideias de como enfrentar as mudanças, tentando de fato evitar as mudanças. Segundo a tartaruga, as mudanças dos novos tempos dependem de entender que a mudança ocorrerá, desejemos isso ou não, e a melhor forma de agir é criar um tipo de sabedoria baseado na convivência, confiança e troca de experiências.
O monge repetia que seu aprendizado fora de assimilar apenas pequenas mudanças, resistindo a grandes mudanças. Para ele é impensável haver uma mudança radical que prejudique a harmonia do grupo, que crie uma situação caótica e que implementa mudanças baseadas nas orientações dos outros. A águia comentou que seu grupo também não gosta de mudanças, pois isso dificulta proteger seus ninhos; no entanto, a natureza as levou a ter sempre drásticas mudanças e, quando alguma fraqueja diante disso, é porque tem medo do fracasso.
Refletindo sobre o que a tartaruga falou, ficou evidente que a convivência e a cumplicidade da águia e do monge gerou progressos em ambos, ainda que diferentes. Um aprendeu a ouvir o outro, e ambos aprenderam a respeitar suas diferenças. Ambos têm capacidade de liderança em tempos de mudança por saberem ouvir e envolver adequadamente os outros no desafio. Dessa forma, uma conclusão que tiraram é a de que, quando se acredita tanto no valor do grupo como no do indivíduo, ligados por forte confiança, a mudança passa a ser aliada para o crescimento, não mais sendo uma inimiga.
Nesse mundo da parábola, o vento é ambíguo, podendo ser uma benção ou um agressor. O desafio é complexo, sendo as incertezas minimizadas ao se juntar competências. No novo mundo VUCA, cada monge e cada águia serão chamados ao centro das atenções por conta de sua contribuição ao grupo, e que todos devem ser ouvidos. Haverá o dia em que ambos estarão do mesmo lado em uma questão e, haverá outro dia em que estarão em lados opostos e, ainda que sejam competidores, isso não significa que sejam inimigos.
O monge então ouviu de sua amiga: existem águias e águias, pois algumas se consideram mais importantes que outras, seja pelo tamanho das asas, formato das penas ou colorido dos olhos. Porém, com o tipo de mudança que enfrentamos agora, essas distinções não podem mais ocorrer, sendo a liderança sempre uma forma de aproveitar a oportunidade e competência, unindo o grupo. De seu lado, o monge comentou que os mestres devem garantir uma estratégia que reúna as forças e habilidades dos indivíduos. E os líderes irão trabalhar para o espírito de sucesso do grupo, mais do que dele próprio, pois mesmo um líder precisa de ajuda nesse mundo complexo e desafiador.
A parábola ainda segue em frente mais um pouco, mas eu não quero tirar o gosto de quem decidir ler o livro. Como forma de resumir os sete princípios básicos para o futuro, após toda a epopeia da águia e do monge:
- Aceite o seu valor, sempre reconhecendo o valor dos outros;
- Transmita sinais verdadeiros para a construção de confiança;
- Aprenda continuamente sobre si, sobre os outros e sobre a vida;
- A mudança em nossas vidas é inevitável e crescente, aceite-a;
- Liberte sua energia para o grupo e propague a sinergia de ideias;
- Descubra campeões, confie no mestre e encontre um sábio;
- Não funciona a liderança de uma só pessoa. Compartilhe decisões.
Finalizando, os autores deixam uma provocação que eu vou agora repassar aos leitores. Temos tratado aqui do mundo VUCA e suas características que diferenciam os tempos modernos por situações altamente disruptivas. Reflita sobre como cada um dos princípios acima se aplica a você e ao seu ambiente de trabalho. Determine onde você encontra mais dificuldades para agir. Pense em como você age diante de mudanças inexoráveis no trabalho, bem como isso interfere na vida familiar (e vice-versa)… E boa sorte nessa estrada!
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